Projeto foi entregue pelo presidente, Jair Bolsonaro ao congresso
A proposta com alteração de trechos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) entregue pelo presidente da república, Jair Bolsonaro (PSL) ao senado, na terça-feira (4), provocou preocupação em diversos segmentos da sociedade, em razão do abrandamento que sugere em algumas infrações.
Cabe destacar que segundo levantamento anual divulgado pela Seguradora Líder, empresa responsável pelo pagamento do DPVAT em todo país, no ano de 2018 foram pagas 5.823 indenizações por invalidez permanente e 601 por morte, em Mato Grosso do Sul.
O Correio do Estado conversou com especialistas e familiares de vítimas fatais para saber a opinião de quem trabalha ou foi diretamente afetado pela violência no trânsito, na capital de Mato Grosso do Sul.
O professor em legislação de trânsito do Departamento Estadual de Trânsito (Detran/MS) e docente no curso de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Fernando Lopes Nogueira, considera mais preocupante a proposição de eliminar a obrigatoriedade de exame toxicológico para habilitação e renovação da Carteira Nacional de Habilitação (CNH).
“No meu entendimento é o pior ponto do projeto, porque é um requisito obrigatório para motoristas de cargas, principalmente aqueles que atuam no transporte de produtos perecíveis e tóxicos. Se um condutor dirige sob efeito de entorpecentes pode se envolver em acidente, tombar o veículo e esparramar carga perigosa em lençois freáticos, por exemplo. Algumas questões podem até ser positivas, mas, esta especificamente se encaixa no princípio de redação ao retrocesso. Isso quer dizer que o poder público não pode fazer leis que prejudiquem alguma parcela da sociedade”, observa.
Nogueira que é doutor em Direito Penal não acredita que as sugestões tenham aprovação do congresso e lembrou que o Brasil participa desde 2011 do pacto internacional para diminuição da violência no trânsito. “O presidente adotou o caminho correto ao entregar ao legislativo o projeto, porém, o teor do documento viola os princípios constitucionais. Infelizmente, a população ainda não tem o hábito de aderir a educação preventiva, mas, só entende a gravidade das infrações quando é multada”, acrescenta.
REDUÇÃO NOS ACIDENTES
O comandante do Batalhão de Polícia Militar de Trânsito (BPTran), Tenente-coronel, Franco Alan, analisa que a proposta de mudança se apresenta contrária a tendência legislativa adotada há pelos menos uma década no Brasil.
“Desde que a legislaçao brasileira intensificou a punição para crimes de trânsito houve uma redução positiva nos índices de morte e violência. Podemos citar um exemplo, apesar do crescimento comprovado da população e da frota ( na última década), o número de mortes no trânsito em Campo Grande caiu de 132 para 70 pessoas. Em contrapartida, houve incremento de 100 mil veículos na frota e da população, que aumentou entre 30 e 40 mil habitantes”, explica.
Alan reforça que endurecimento com multas para utilização do celular ao volante, lei seca e aumento da pena para homicidio no trânsito, de 3 para 6 anos, são alguns exemplos de medidas que contribuíram para diminuição na violência. “Não acredito que essas medidas sejam aprovadas, até porque no congresso serão consultados profissionais que estudam e trabalham no setor. Ainda assim é preciso reforçar que o aumento de violência no trânsito é pago com a vida humana”, finaliza.
CRIMES IMPUNES
Na madrugada de 25 de março de 2013, a jornalista Aline Lira, perdeu o irmão de 31 anos em um acidente de trânsito, na cidade de Campo Grande. Ele foi atropelado por um motorista embriagado e faleceu depois de ficar 11 dias em coma. O motorista, Edson Moreira, passou pelo teste do bafômetro e estava com 1,4 mg de alcool no sangue, enquanto a resolução nº 432 da Lei Seca autua o motorista com 0,05 miligramas.
“Quando foi abordado ficou comprovado o alto grau de embriaguez e além disso, ele (Edson) era foragido da justiça do Paraná por matar uma pessoa. Ele foi julgado, porém, foi solto pouco tempo depois e vive tranquilamente com a família em Três Lagoas. Enquanto isso eu e minha familia fomos devastados pela segunda vez numa tragédia de trânsito”, recorda.
Em 2007, a jornalista perdeu o tio que voltava do trabalho conduzindo uma bicicleta. “Uma motorista jovem que dirigia o carro e falava ao celular atingiu meu tio que morreu poucos dias depois do acidente. A defesa da mulher disse que ele estava embriagado e isso é mentira, porém, ela também não foi presa e segue impune ao crime de homicidio”, lamenta.
Aline avalia que as mudanças propostas pelo presidente Bolsonaro são muito equivocadas e podem abrir brechas para o relaxamento de motoristas sem consciência. Ela cita um exemplo, de aumentar a pontuação limite de infrações de 20 para 40 pontos, na Carteira Nacional de Habilitação.
“Diariamente acompanhamos notícias de acidentes com vítimas graves ou mortes nas ruas de Campo Grande. Entre os motivos, direção sob efeito de alccol, alta velocidade e avanço de sinal vermelho, então penso que é um erro gigante falar que existe uma “indústria de multas”. O que precisa ser verificado é para onde vai e como é utilizado o dinheiro arrecadado pelo pagamento das multas”, conclui.
Seja o primeiro a comentar